"Como vivi o 25 de Abril de 74
Tinha 15 anos e vivia numa pequena cidade do Alentejo, andava no correspondente ao actual nono ano, a minha família não era politizada e não fazia a menor noção de que vivíamos numa Ditadura. As raras vezes que coloquei alguma questão mais impertinente fui logo aconselhada a silenciar ideias tão disparatadas. A televisão apareceu em minha casa tardiamente, o que hoje agradeço, pois obrigou-me a ler todos os livros a que deitava a mão, mas nessa manhã de Abril estava particularmente estranha. Como só tinha aulas no turno da tarde, constatei com pena que não podia ver mais um episódio da séria «Olho Vivo», a insistente música do MFA não parava. O meu pai, funcionário público foi mandado para casa, pois «algo se passava em Lisboa» - falava-se em revolução e esta palavra assustou as pessoas. Havia pouca gente nas ruas, segredava-se, e os rostos revelavam alguma apreensão. A minha mãe não me deixou ir à escola, poderia haver desacatos. No dia seguinte a professora de Português explicou-nos o que se passou e disse-nos que pela primeira vez podia falar sem medo, soubemos mais tarde que tinha um passado anti - fascista. De repente senti um enorme entusiasmo, apesar da pouca informação percebi que algo de grandioso se passara no nosso país. A palavra Liberdade começou a ecoar por todos os lados. Já participei na 1ª Manifestação do Dia do Trabalhador, nas primeiras filas. Houve fotografias expostas na montra do fotógrafo, o meu pai ainda me advertiu, dizendo que se o regime mudasse poderia ser perigoso, mas hoje acho que até ele já tinha percebido que há caminhos sem volta e que aquele passo era de tal modo grandioso que jamais poderia ser anulado. Tornei-me uma entusiasta do 25 de Abril, da liberdade de pensamento e de expressão, enfim da Democracia. Penso que esta experiência ditou o meu futuro e me tornou uma amante fanática da Filosofia – um dos palcos do pensamento livre. Dedico esta reflexão aos meus filhos e aos meus alunos – à geração que tem de manter vivo o sonho iniciado pelos vossos pais e avós. A liberdade não é uma dádiva, é uma conquista permanente, a vocês compete nunca permitir que ela se apague."
Manuela Duarte,
Docente de Filosofia da ESFLG
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